segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Breve ensaio sobre a democratização do Oriente Médio como possibilidade. By Vitor Santos.

A sequência de eventos denominada primavera árabe evidencia explicitamente a não mais aceitação do povo árabe à regimes autoritários e opressores, porém isso não necessariamente implica na construção de uma democracia genuína nesses países devido à fatores estruturais daquelas sociedades.
Inicialmente o motivo pelo qual os eventos começaram não foi exatamente um apelo à democratização e sim, um grito de desabafo de um povo que não mais suporta as arbitrariedades, injustiças e corrupções do modelo de governo vigente até o momento e conseguiram se articular para mostrar essa insatisfação. Embora os ditadores tenham ainda tentado se opor e sufocar os levantes usando todos os artifícios que lhes fossem convenientes incluindo violência e armamento pesado, a força da manifestação popular, respaldada ainda no apoio da opinião pública do cenário mundial convencida pelas denúncias veiculadas principalmente na internet, conseguiram vitórias importantes nesses países o que pode indicar uma mudança de cenário no mundo árabe. Os novos governos pós-primavera deverão se adequar à nova demanda social que não mais aceita o autoritarismo militar como forma de dominação ainda que este use a bandeira da religião como amparo de justificação das suas ações. O que se vê agora é que os líderes temporários estão cada vez mais cautelosos nas suas decisões para não incidirem em comportamentos parecidos com seus antecessores autoritários.
Essa luta por participação popular nas decisões, de garantia de diretos básicos comum a todos, bem como o pleito de eleições diretas dos governantes não caracteriza necessariamente a busca pela democratização desses países e há razões para se crer nisso. Inicialmente pelo fato de que estes países nunca tiveram uma experiência democrática para usar como referência. Segundo que os valores religiosos sempre foram os sentimentos comuns mais fortes que os unia e foi esta mesma religião que foi usada como pano de fundo para manutenção do poder nas mãos de uma minoria rica e opressora. A religião, portanto, sempre os conduziu à submissão cega e omissa dos ditames dos seus líderes. O regime democrático, por outro lado, é uma criação do Ocidente o que, por si só, já desperta prévia rejeição da maioria fundamentalista além do fato de que a Democracia para o ocidente engendra em si uma série de conceitos e valores não compartilhados pelo povo do Oriente Médio como, por exemplo, a ideia dos direitos humanos, a igualdade de todos perante a lei independente de sexo, religião, raça etc.
O advento das redes sociais contribuiu fortemente para a organização e inicio das manifestações e isso mostra que, embora historicamente o mundo árabe fosse sempre regido por esses poucos detentores do poder, a população finalmente encontrou um meio por onde se expressar e se organizar. Um meio no qual as autoridades não têm tanto poder, ou não são tão eficientes na tentativa de sufocar essa comunicação. Outro fator que evidencia que a democratização não era inicialmente o objetivo a se alcançar no inicio das manifestações é o fato de que nesses países, quando os manifestantes conseguiram derrubar o poder constituído, como nos casos do Egito, Libia e Tunísia, um projeto de sucessão de regime não havia sido elaborado muito menos definido quem ocuparia esse poder. Um regime provisório então se fez necessário para garantir a transição menos sofrível para o povo de um poder para o outro. O fato é que, eles começam a definir o que não querem mais para si em termos de governo, porém isso não significa que a democracia seja sua escolha daqui pra frente, até porque vale considerar que primeiramente eles precisariam aprender sobre essa forma de governo e concordar com as suas características básicas, ainda que as adaptassem à sua realidade.
O mundo ocidental, pré-cursor da Democracia deve então contribuir para que essa nova realidade se consolide e impeça que os regimes totalitários religiosos voltem a se estabelecerem no mundo árabe. Pode-se começar por negociar a partir da apresentação de propostas de como um país pode transigir de um regime para o outro. A ONU como representante oficial dos Estados no mundo poderia assessorar essa transição. O Ocidente já interviu em alguns desses conflitos mostrando que não está alheio aos acontecimentos daquela região e também o seu posicionamento em relação a isso. É necessário então dar suporte às novas propostas de governo que acentuem os valores democráticos e garanta o direito das pessoas daquele lugar. Esse é um dos caminhos para ampliar o alcance dos valores consagrados na carta dos direitos humanos universais e uma contribuição importante na minimização do uso da força como instrumento de resolução de conflitos, haja vista poder se observar na história que nunca um país democrático guerreou com outro com o mesmo tipo de regime. O primeiro e sofrido passo já foi dado, a continuação da caminhada depende não só do povo árabe, mas também do eco que o resto do mundo emitirá de volta a eles.